sexta-feira, 4 de junho de 2010

Na falta de Luzia Zani.


Sinto a falta de uma parte de mim. Era tão presente, hoje tão distante. – Vó cadê meus cachos?
Era toda a minha proteção. Era grande. Mesmo aos 18 me colocou no colo, me deu amor, e toda força que precisei quando pensei que ninguém mais me ajudaria. A simples frase foi. – Eu te amo do jeito que você é. Assim ela se fez em mim! Brigava quando eu dormia demais, sempre perguntava se eu estava doente. E se não estava, ela dizia que ficaria, por ficar no computador até tarde. Era minha falta de medo que a protegia quando relâmpagos caiam, quando ventava demais, quando chovia, e quando a noite chegava e parte dela ainda não estava (Catarina, Ana Laura e Ana Carolina). Sem perder o controle, ela mantinha as coisas em ordem.
Hora para chegar, dormir, comer era obrigatório. Na falta que me faz, o dia vira noite e noite vira dia, não sinto sono, comer já não faz diferença. Hoje sem chorar a tempos, senti medo... A fixa caiu e você não está aqui! Não sei como pode, nos últimos dias. E me parecia tão tranqüila, tão calma,... Era claro de mais. Claro que ela já sabia que era chegada sua hora...
- Vó como é andar de ambulância? Quando eu andei estava desmaiada.
- Ah!!! Balança muito, quase passei mal!
Assim fiquei calada. Sempre tentando fazer um sorriso sair dali.
- Sua boca está machucada? Esta doendo?
- É, esta ferida. Acho que preciso passar um batom.
Sem ninguém entender eu não parava de rir. Que engraçado você querer usar batom, 18 anos seguidos e nunca tinha visto a palavra “batom” suar tão bem em sua boca. (Ela não gostava)
- Vóooooooooo me conta. O medico é bonito?
- Ah!! é sim, mas ele tem a calça rasgada, a cueca dele é azul. Como pode um médico bonito desses usar calça rasgada? E ele é casado com a médica, ela é linda!
- É mesmo vó?
Assim na esperança dos dias, se fez virada de ano, começo e fim!
Tão agonizante, em casa sozinha. Tudo me parecia normal. Liguei, conversei com todos, inclusive com ela. Mandou-me beijos e disse que estava voltando para casa. Sem pensar eu disse.
- Tô te esperando.
Quando amanheceu o telefone tocou... Uma voz desesperada que me perguntava o que estava acontecendo. Quando na verdade quem deveria perguntar por que tamanho desespero, era eu!
Disse que estava tudo bem, e minha vó estava voltando.
O telefone desligou.
Minutos depois alguém bate na minha porta. Pensei que era a funcionária... Era cedo de mais, não poderia ser ela. Eu estava sozinha. Levantei... Era ela. Não, não era minha vó. Era a mulher quem trazia a notícia... De que minha vó teria “descansado”...
(risos) meu corpo não agüenta minha mente não acompanha. Pediram-me calma. Calma pra que? Eu ainda não tinha entendido o que estava acontecendo. Ela entrou, sentou, o relógio voltou a rodar novamente eu comecei a entender. Eu precisava ser forte e achar meu vô. Sabiam que isso não era para mim. Então realmente eu precisava dar uma volta... Não durou nem 2 minutos e não dei nem 5 passos, eu não conseguia mandar em minhas pernas.
No desespero da hora, me perguntava, onde estava minha calma? Minha mãe liga e fala: Ela ainda esta aqui comigo, fica calma, seja forte e ela está linda, foi tranqüila. Eu podia ouvir a respiração ofegante da minha mãe ao segurar o choro.
Não foi nada fácil contar para o homem, com qual vivera 65 anos ao lado de alguém que acabava de partir. Viajem eterna... Ele não acreditava, era preciso ver para crer.
Em carros diferentes tomamos rumos diferentes... Chegamos ao mesmo lugar, horas depois. Com o mesmo intuito: “despedir”.
E foi isso que aconteceu. Seria tenso demais se eu relatasse como foi para mim. Sei que foi cruel o que o tempo fez comigo.
Ninguém pergunta se ainda tinha passos para dar ao lado dela que eu tanto amava, se minha vida estava entrelaçada com aquela que o tempo acabou de me arrancar. Ela vem te arranca, e se não esta preparada o problema é todo seu, por que ela nada sente. É incapaz de perceber que precisamos de mais alguns instantes. Eu queria sentir aquele cheiro por mais algumas horas, o som daquela voz.
Mesmo achando injusto, mesmo achando cedo demais.
Nada mais pode ser feito.

Ó meu pai do céu, limpe tudo aí
Vai chegar a rainha
Precisando dormir
Quando ela chegar
Tu me faças um favor:
Dê um batom a ela, que ela me benze onde eu for...

Penso que deveria ser proibido vó e mãe morrerem. Mas um dia vou ser mãe e avó; e vou pensar que é proibido filhos morrerem... Então aceitando que siga a ordem natural das coisas. Nada mais, nada menos. Cada um no seu tempo...

Amor é para sempre. Te amo. Obrigada...




Ana Laura Zani

Um comentário:

  1. Somos todos um pedacinho dela, e ela, com certeza, um pedaço de nós.
    Um exemplo de amor incondicional. De aceite incondicional.
    Pra sempe, nossa amadinha, assim como sei, continuamos a sermos dela.
    Luciana Zani

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